Seca afeta crescimento infantil

Quase metade das meninas e dos meninos das áreas afetadas pela seca no sul de Madagascar sofre má nutrição. Foto: Miriam Gathigah/IPS

Quase metade das meninas e dos meninos das áreas afetadas pela seca no sul de Madagascar sofre má nutrição. Foto: Miriam Gathigah/IPS

Por Miriam Gathigah, da IPS – 

Ambovombe, Madagascar, 12/7/2016 – O pequeno malgaxe Voahevetse Fotetse aparenta ter três anos, mas tem seis, e vai à escola de Ankilimafaitsy, no distrito de Ambovombe, na região de Androy, em Madagascar, uma das mais afetadas pela seca que atinge o sul desse país africano. “Fotetse é um dos muitos alunos da escola que, devido à má nutrição crônica, é muito pequeno para sua idade, muito baixo e muito magro”, disse a diretora, Seraphine Sasara.

A escola tem 348 alunos, 72 meninos e 276 meninas, entre três e 15 anos. Há poucos homens porque têm que ajudar na granja ou pastoreando o gado. Mas a tendência muda quando as meninas completam 15 anos, pois a maioria se vê obrigada a abandonar os estudos para casar. Escolarizados ou não, quase metade das meninas e dos meninos do sul de Madagascar não escapam da má nutrição.

O Programa Mundial de Alimentos (PMA) informou que o atraso no crescimento – quando a estatura está abaixo da média para a idade – afeta pelo menos 47% dos menores de cinco anos. Ao contrário da má nutrição aguda, que pode se desenvolver em um breve período e é reversível, o atraso no crescimento tem consequências de longo alcance. “O atraso no crescimento é um processo gradual e acumulativo de mil dias, desde a concepção e até os dois primeiros anos de vida”, explicou Sasara à IPS.

As causas têm a ver com uma alimentação deficiente, repetidas infecções ou uma combinação de ambas. “Não se trata apenas de uma criança ser muito pequena para sua idade, ter severas consequências irreversíveis, como risco de morte e capacidades físicas e cognitivas limitadas”, acrescentou a diretora. Os dados disponíveis mostram que dois milhões de meninos e meninas nesse país da África austral apresentam atraso no crescimento, o que coloca Madagascar em quarto lugar na lista de Má Nutrição Crônica Global.

Embora, em fevereiro deste ano, a má nutrição aguda global afetasse 8% das crianças, é muito maior em várias regiões do sul de Madagascar, onde diversos distritos superam o limite crítico de 10%. A falta de chuva e a seca persistente no sul do país deteriorou a segurança alimentar em numerosas famílias, o que teve impacto significativo no estado nutricional dos menores de cinco anos. Além disso, Sasara afirmou que a situação piorou devido ao costume, em todo o país, de se comer arroz, “que é o alimento do desjejum, do almoço e do jantar”.

Porém, Mamy Perline disse à IPS que nem sempre há arroz disponível. “Dou aos meus oito filhos arroz pela manhã e no jantar, mas no almoço têm que comer a fruta do cacto”, afirmou. Segundo o PMA, que está à cargo de um programa de alimentação nas escolas dos distritos afetados pela seca, o de Tsihombe é o que apresenta pior situação, com média de 14% dos menores de cinco anos com sintomas de má nutrição aguda.

A agência estima que quase 50% dos meninos e das meninas malgaxes menores de cinco anos apresentam deficiência de ferro, que causa anemia. A falta de água potável e de condições adequadas de saneamento agravam a situação que afeta o sul de Madagascar. Isso faz com que 62 crianças em cada mil nascidos vivos morram antes de completar os cinco anos.

A educação continua suportando a pior parte da grave seca, pois os dados de várias agências humanitárias, incluído o PMA, mostram que a matrícula no curso primário registra espiral descendente em Madagascar. Em 2006, 96,2% das crianças se matricularam, mas a proporção caiu para 69,4% em 2012. Sasara estima que atualmente a matrícula é muito menor porque as crianças passam muita fome para poderem permanecer em aula.

Isso ocorre na aldeia de Tanandava, no distrito de Amboasary, em Anosy, onde centenas de estudantes se reúnem diariamente em um centro da organização Catholic Relief Services, onde recebem uma refeição diária. O PMA indica que há 1,5 milhão de crianças não escolarizadas entre seis e 12 anos, com regiões como Anosy, Androy e Atsimo Andrefana, no sul, onde as elevadas taxas de insegurança alimentar causam um alarmante baixo rendimento escolar.

Desde 2005, o PMA implanta o programa de alimentação escolar, no qual oferece uma refeição fortificada para quase 300 mil crianças diariamente, em 1.300 escolas primárias no sul, e também os assentamentos irregulares de Antananarivo, Tulear e Tamatave. “As refeições são complementadas com micronutrientes, fundamentais para cortar o ciclo de má nutrição no país”, explicou Sasara.

O programa de alimentação escolar é um esforço comunitário em que os pais participam da elaboração da refeição, o que se converte em uma plataforma para implantar outras intervenções no sentido de melhorar a saúde e a nutrição de crianças vulneráveis. As intervenções têm o objetivo de melhorar a disponibilidade de água potável e saneamento, um problema duplo na região.

“Quando chove e acumula água nos buracos da estrada, nós a coletamos em recipientes para beber, cozinhar e lavar. Não importa quantos automóveis ou pessoas tenham pisado nela, é a única fonte que temos”, contou Perline. Com o aumento de casos de má nutrição aguda, um fator que propicia a mortalidade infantil, o PMA apoia o Escritório Nacional de Nutrição, por meio de seu Escritório Regional de Nutrição, que oferece programas de alimentação complementar para o tratamento de casos moderados de má nutrição nas aldeias do sul do país.

“O tratamento de meninos e meninas com má nutrição aguda moderada pode reduzir drasticamente o número de pessoas afetadas e restabelecer um estado nutricional adequado”, ressaltou Yves Christian, diretor do Escritório Regional para a Nutrição. Além disso, o PMA oferece assistência técnica ao governo em diferentes níveis, que se espera derive em um programa nacional de alimentação escolar.

Por fim, serão implantados novos projetos-piloto com outras modalidades de alimentação escolar no início do próximo ano letivo, em setembro deste ano. Envolverde/IPS

Miriam Gathigah

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