Na corda bamba e sem rede de proteção

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A falta de educação e capacitação condena muitos jovens de Bangladesh, bem como de outros países, a viverem na pobreza. Foto: Naimul Haq/IPS

 

Nações Unidas, 18/10/2013 – O 1% mais rico da população mundial possui 40% dos bens do planeta, e a metade mais pobre fica com apenas 1% desses ativos. Nas últimas décadas, apesar do crescimento econômico, esse desequilíbrio ficou mais profundo na maioria dos países e quase em cada região do mundo. Essa desigualdade é, cada vez mais, reconhecida como um persistente obstáculo para o desenvolvimento. O problema toma várias formas, desde brechas na renda até acesso desigual à política, e é alimentado por diferentes fatores, como gênero, etnia, deficiências, situação legal, casta, cor da pele, língua e status econômico.

Yoke King Chee, especialista da Rede do Terceiro Mundo, acredita que a desigualdade não se agrava apenas dentro dos países ricos e industrializados que integram a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE), mas também em nações do Sul que estão experimentando um rápido crescimento. Os desequilíbrios e falhas do comércio e das finanças internacionais são a causa principal, acrescentou.

“As respostas políticas e regulatórias inadequadas à última série de crises financeiras revelam uma debilidade sistêmica que continua fazendo com que os países sejam vulneráveis a uma maior instabilidade”, disse Chee à IPS. Os países em desenvolvimento que adotaram reformas financeiras, mas dependem das exportações, foram igualmente vulneráveis à crise de 2008, e os que mais sofreram foram os trabalhadores dos setores que vendem para o exterior, acrescentou a especialista.

Um grupo de 17 especialistas em direitos humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) assinalou, em maio, que a desigualdade muitas vezes desata problemas sociais que prejudicam ainda mais grupos já atrasados e marginalizados. Além disso, o acesso desigual à riqueza permite que os mais acomodados esgotem os recursos, agravando a degradação ambiental e a mudança climática, fenômenos que, por sua vez, atingem especialmente os mais vulneráveis.

Esse grupo disse que o aprofundamento da desigualdade afetou severamente muitos avanços obtidos com grande esforço para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). E recomendaram que a  agenda de desenvolvimento posterior a 2015 deve incluir metas específicas e mensuráveis para eliminar a desigualdade. Um Grupo de Trabalho Aberto, integrado por países-membros da ONU, começará a discutir em maio de 2014 quais serão os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que sucederão os ODM quando vencer o prazo para seu cumprimento, em 2015.

Os especialistas dizem que, se for definido como eixo a luta contra a desigualdade, cada nova meta deverá abordar as injustiças sistêmicas que a causam, desde a discriminação institucional contra minorias até os desequilíbrios nos investimentos sociais. Além disso, a proteção social é “uma parte indispensável das políticas para acabar com as desigualdades e assegurar que a agenda pós-2015 não deixe fora nenhum grupo, nem comunidade, nem região”, destacou o grupo de especialistas.

De todas famílias do mundo, 80% carecem de proteção social, apesar da evidência de que contribui significativamente para reduzir a pobreza, a coesão social e o respeito aos direitos humanos, além de servir de resguardo diante de impactos como a carestia de alimentos, afirmaram os especialistas. Na opinião desse grupo, a agenda pós-2015 deve incluir a recomendação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de fixar níveis mínimos de proteção social, ajudando a criar mecanismos de financiamento para os países em desenvolvimento.

A equipe está integrada por Verene Sheperd, do Grupo de Trabalho de Especialistas sobre Pessoas Afrodescendentes, Alfred de Zayas, especialista independente para a Promoção de uma Ordem Democrática e Equitativa, Magdalena Sepúlveda, relatora especial sobre Pobreza Extrema e Direitos Humanos, e Olivier De Schutter, relator especial sobre o Direito à Alimentação, entre outros.

Em uma coluna publicada no jornal The New York Times no começo desta semana, Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de Economia, recordou que, nas últimas décadas, a desigualdade disparou na maioria dos países ricos, sobretudo nos Estados Unidos. Mas o que estará acontecendo no resto do mundo?, perguntou. Fecha-se a brecha entre os países, enquanto potências emergentes como China e Índia tiram centenas de milhões de seus habitantes da pobreza? E o que ocorre nos países pobres e de renda média? A situação se agrava ou melhora?

Segundo Robert Bissio, diretor da rede internacional de organizações contra a pobreza Social Watch, as estatísticas positivas podem, às vezes, ocultar realidades mais complexas. O Banco Mundial assegurava, em 2010, que já havia sido cumprida de forma antecipada a meta 1A dos ODM: reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, a proporção de pessoas com renda inferior a um dólar por dia, apontou à IPS.

Entre 1990 e 2010 as exportações mundiais totais aumentaram quase cinco vezes, passando de US$ 781 bilhões para US$ 3,7 trilhões. E, no mesmo período, a renda individual média mundial quase duplicou, de US$ 4.080 anuais, em 1990, para US$ 9.120, em 2010. Esse aumento no comércio e na riqueza não se refletiu na evolução dos indicadores sociais, concluiu Bissio.

Chee disse à IPS que os países em desenvolvimento ainda perdem uma parte significativa dos benefícios dos investimentos diretos e do valor agregado. Aquelas nações que não são exportadoras de matérias-primas alimentícias sofrem ainda a especulação como uma vulnerabilidade adicional. Países que dependem da mineração controlada por corporações transnacionais sofrem uma grande destruição ambiental e problemas sociais, e têm sistemas tributários regressivos, apropriados para essas indústrias.

“Tudo isso contribui para a desigualdade”, afirmou Chee. Segundo essa especialista, “as políticas de austeridade que muitos governos europeus estão impondo agora, e que têm impacto nos setores de renda baixa e até média, são uma réplica do que sofreram os países do Sul pelas condições impostas durante décadas pelo Fundo Monetário Internacional”. Envolverde/IPS

Thalif Deen

Thalif Deen, IPS United Nations bureau chief and North America regional director, has been covering the U.N. since the late 1970s. A former deputy news editor of the Sri Lanka Daily News, he was also a senior editorial writer for Hong Kong-based The Standard. He has been runner-up and cited twice for “excellence in U.N. reporting” at the annual awards presentation of the U.N. Correspondents’ Association. A former information officer at the U.N. Secretariat, and a one-time member of the Sri Lanka delegation to the U.N. General Assembly sessions, Thalif is currently editor in chief of the IPS U.N. Terra Viva journal. Since the Earth Summit in Rio de Janeiro in 1992, he has covered virtually every single major U.N. conference on population, human rights, environment, social development, globalisation and the Millennium Development Goals. A former Middle East military editor at Jane’s Information Group in the U.S, he is a Fulbright-Hayes scholar with a master’s degree in journalism from Columbia University, New York.

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